21 de junho de 2018

Prótese


(Francesca Woodman)


Quando alguém se apaixona, escreve muito bem. E, de maneira geral, se alguém não tem experiência de vida, sobre o que irá escrever? Passar o tempo com foco apenas na escrita é a ambição de um adolescente, de um adolescente triste. Viver é uma perturbação constante da escrita, mas, sem isso, escrever é um rabisco frívolo na água. Dito isso, a vida, quando tem a força de um maremoto, pode devorar o tempo de escrever. A maternidade, em minha experiência, certamente é capaz de varrer a necessidade de escrever. Engravidar, trazer uma criança para o mundo e criá-la é uma experiência maravilhosa e dolorosa que consome muito tempoespecialmente se você não tem dinheiro para comprar o tempo e a energia de outras mulherese que rouba espaço e sentido de todo o resto. Naturalmente, se a necessidade de escrita é forte, cedo ou tarde você vai encontrar um arranjo que te dê alguma brecha. Mas isso vale para todas as experiências fundamentais da vida. Elas nos atingem, nos submergem e, se não acabamos mortos em algum canto, nós escrevemos.

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A metáfora do nascimento aplicada ao trabalho de escrita nunca pareceu convincente para mim. A metáfora da tecelagem soa mais eficaz. Escrever é uma das próteses que inventamos para dar poder a nosso corpo. Escrever é uma habilidade, um forçar de nossos limites naturais que requer longo treinamento para assimilar técnicas que nós usamos com perícia crescente e inventamos novas, se for preciso. A tecelagem representa bem essa ideia. Nós trabalhamos por meses, por anos, tecendo um texto, o melhor que somos capazes naquele momento. E quando está pronto, está lá, para sempre o mesmo, enquanto nós mudamos e continuaremos a mudar, prontos para tentar criar outras tessituras.


(Elena Ferrante (fragmento de entrevista) - tradução de Fabiane Secches - versão feita a partir da tradução para o inglês realizada pelo Los Angeles Times. )

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