24 de janeiro de 2011

Sobre uma fina casca de gelo


Como diz a tradição dos monges antigos, você vai para o deserto para entrar em contato com seus próprios demônios, olha aí a idéia do auto-conhecimento. Não existe nenhuma forma de auto-conhecimento a sério se você não entra em contato com seus demônios. Se você acha que não tem demônios é porque não tem nem um milímetro de auto-conhecimento porque o processo de auto-conhecimento é sempre um mergulho nos próprios demônios.

O filósofo americano do século XIX chamado Emerson fala assim (…) que a época que ele vivia era uma época em que a vida, o mundo e a sociedade se transformou numa espécie de lago congelado. Esse lago congelado tem uma fina casca de gelo sobre ele e o que a gente faz é deslizar sobre essa fina casca de gelo (…). Quando você está deslizando sobre uma fina casca de gelo se você andar devagar você morre, se você parar o chão racha.
O que o autor queria dizer é que o mundo que a gente vive demanda de você tamanha agilidade, tamanha aceleração, tamanha leveza, tamanha superficialidade que qualquer profundidade pode colocar sua vida em risco. (…) Deslizar pelo lago congelado demanda de você uma agilidade cada vez maior, uma competência cada vez maior, uma eficácia cada vez maior. E se você não fizer esse movimento na realidade o chão racha e você cai no lago congelado.

(…) Como você pode sobreviver deslizando continuamente sobre um lago congelado? (…) Uma das únicas chances que você tem de pensar sério nas coisas e passar a ter consciência é quando simplesmente você cansa de fazer o jogo. A consciência estaria associada a possibilidade que você tem de parar de fazer o jogo e correr o risco de diminuir a velocidade. E se você diminui a velocidade, você corre evidentemente o risco do chão rachar e no momento que o chão racha é aí que você pode ter a experiência da vertigem que acontece no devir do auto-conhecimento.

Luiz Felipe Pondé

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