1 de outubro de 2009

Duas de Flor




"E o poema se torna, então, uma operação sensitiva, onde a dor é a matéria-prima capaz de criar, apurar e transfigurar o mundo, a grande e original via - o único atalho verdadeiramente feminino - de conhecimento."
(do estudo de Maria Lúcia Dal Farra - "A obra de Florbela Espanca")




Poetas

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.

Andam perdidas na vida,
Como as estrelas no ar;
Sentem o vento gemer
Ouvem as rosas chorar!

Só quem embala no peito
Dores amargas e secretas
É que em noites de luar
Pode entender os poetas

E eu que arrasto amarguras
Que nunca arrastou ninguém
Tenho alma pra sentir
A dos poetas também!

(Florbela Espanca - 8/1/1916)




Sem remédio


Aqueles que me têm muito amor

Não sabem o que sinto e o que sou...

Não sabem que passou, um dia, a Dor,

À minha porta e, nesse dia, entrou.


E é desde então que eu sinto este pavor,

Este frio que anda em mim, e que gelou

O que de bom me deu Nosso Senhor!

Se eu nem sei por onde ando e onde vou!!


Sinto os passos da Dor, essa cadência

Que é já tortura infinda, que é demência!

Que é já vontade doida de gritar!


E é sempre a mesma mágoa, o mesmo tédio,

A mesma angústia funda, sem remédio,

Andando atrás de mim, sem me largar!...


(Florbela Espanca - Livro de Mágoas)

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