20 de setembro de 2019

Confidência Papareia







Alguns anos vivi à beira do mar
Principalmente nasci em cidade de mar
Por isso sou mansa, revolta: de maresias
Noventa por cento de sal nas calçadas
Oitenta por cento de brisa nas almas
E esse alheamento do que na vida é ancoradouro e partida

A vontade de amar, que me paralisa o barco
Vem como barlavento, de noites frias, de uma mulher e um só horizonte

E o hábito de sofrer, que tanto me adverte
É salgada herança litorânea

Do velho porto trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta rosa dos ventos, para futuras direções
este astrolábio de um velho navio naufragado
este farol da praia que se chama Solidão
este aceno, o olhar mareado

Tive ondas, tive conchas, tive proa
Hoje sou pescador sem rede
O Altair é apenas uma fotografia na parede
E às vezes dói


(releitura de "Confidência do Itabirano" - Drummond)

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